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  • 23 de mar. de 2020
  • 4 min de leitura

Atualizado: 3 de abr. de 2020

Dr M. MATTEDI

Universidade Regional de Blumenau

mam@furb.br



Na semana passada a OMS declarou que o Coronavírus (COVID-19) atingiu mais que 100 países e se converteu numa pandemia. As informações sobre o ritmo de contaminação são alarmantes. O epicentro de contaminação se deslocou territorialmente da Ásia para Europa, atingindo os Estados Unidos e chegando ao Brasil. A confirmação que o Brasil estava em estágio de transmissão comunitária desencadeou o pânico na população. Afinal, como em todas as situações de emergências, também a pandemia do COVID-19 afetará os mais vulneráveis. Por isto, a conta será paga, principalmente, pelos mais pobres e sem assistência de saúde.


Os impactos do COVID-19 no Brasil refletem as propriedades sociais e políticas que caracterizam a sociedade brasileira. Duas características principais marcam o desenvolvimento da sociedade brasileira: a) Desigualdade Estrutural: a concentração da renda; b) Patrimionialismo Estatal: apropriação coorporativa do Estado. Por isto, é razoável supor que epidemia tende a se espalhar mais facilmente entre as pessoas que vivem nas regiões pobres e que o Estado não terá capacidade de atender adequadamente a todos. Portanto, o impacto do COVID-19 no Brasil vai se diferenciar segundo o nível de renda e segundo o tipo de assistência a saúde.


Em todos os países a gestão da crise do COVID-19 depende da confiança da população nas recomendações dos governantes. Porém, no Brasil a população não pode confiar no Governo Bolsonaro. Inicialmente o Presidente Jair Bolsonaro minimiza o impacto do COVID-19, para logo em seguida maximizar as consequências. É que depois de classificar o a pandemia como uma fantasia, o reconheceu a gravidade da situação numa farsesca reunião de ministros. Por um lado, manda sinais ambivalentes para a população amplificando a sensação de insegurança; por outro, subordina a gestão da emergência a sua agenda política de comunicação.


Isto acontece porque o Presidente Jair Bolsonaro resolveu politizar a pandemia do COVID-19. Em seu Presidencialismo de Polarização as recomendações de confinamento social propostas pelos especialistas visariam prejudicar seu governo. Por isto, não parece interessado na coordenação de esforços de confrontação da crise. É que sua política de divisão não funciona em questões que necessitam de coordenação e integração de esforços. Porém, a demora e a falta de coordenação nas ações do Governo Federal vão aumentando as incertezas. Os efeitos emergentes da política de divisão podem ser ilustrados por dois exemplos emblemáticos.


O primeiro exemplo diz respeito a inconsequente participação do Presidente Jair Bolsonaro nas manifestações do dia 15 de março. Quando já havia evidências de contaminação comunitária a participação do presidente foi um mau exemplo para população. Afinal, enquanto os Bolsonaristas eram estimulados a participar das manifestações respaldados pela Posição Minimalista do presidente #TodosPorBolsonaro; a oposição assumiu a Posição Maximalista por meio da #FiqueEmCasa. O efeito desta atitude constitui a intensificação da divisão política. Ou seja, a gestão da pandemia do COVID-19 se transformou numa questão de apoio político.

O segundo se refere a disputa pelas sacadas. O Bolsonarismo encara a pandemia do COVID-19 como uma disputa ideológica. Neste sentido, o que está em jogo é, por um lado, a convergência do centro e da esquerda no “panelaço”; e, por outro, o “apluasaço” aos trabalhadores da saúde promovidas pelo o Bolsonarismo. Assim, Bater Panela as 20:30 significa ser contra o Governo Bolsonaro, porém Bater Palmas significa que as pessoas são favor. Neste sentido, não custa perguntar: quais são, afinal, as condições de trabalho destes trabalhadores do setor de saúde? Não importa, afinal para o Bolsonarismo tudo se reduz a confrontação ideológica!


A incapacidade política do presidente de liderar o combate ao COVID-19 se materializa institucionalmente num conflito federativo entre o governo federal e os estados. Neste sentido, a gestão da emergência vai se transformando numa queda de braço entre o presidente e os governadores. Por um lado, os governadores defendem medidas radicais de prevenção, o presidente defende a ideia que a atividade econômica não deve ser interrompida. Desta forma, a gestão da emergência é reduzida duas opções políticas: impeachment e golpe. O que está em jogo não é, claro, a segurança da população, mas a disputa eleitoral de 2022.


A polarização acontece porque o Presidente Jair Bolsonaro subordina as estratégias de gestão a sua agenda de comunicação política. Ocorre, contudo, que a tática da distração (ataques e agressões verbais a adversários ou opositores) nas mídias sociais tem efeito inverso em situações de emergência. É que a estratégia do presidente de se comunicar por meio das mídias sociais dificulta a gestão da emergência. Em situações emergência as Macro News dos canais convencionais são mais eficientes que as Micro News das mídias sociais. Não existe uma diretriz geral porque o presidente ainda não conseguiu fazer um pronunciamento de integração da nação.


O custo político da gestão do COVID-19 vai isolando o Presidente Jair Bolsonaro. A exposição das medidas adotadas explicita o despreparo técnico e o improviso administrativo de seu governo. A avaliação crítica dos equívocos do governo faz com que o capital político do Presidente Jair Bolsonaro encolha inclusive nas mídias sociais. Com isso o Bolsonarismo vai se reduzindo cada vez mais aos nichos autoritários de apoiadores. A estratégia da divisão e distração acaba criando inimigos imaginários e comprometendo a gestão da crise. A pandemia do COVID-19 vai mostrando que o Presidente Jair Bolsonaro não está a altura do cargo que ocupa!


No Brasil as pessoas não conseguem se sentir seguras pelo desalinhamento entre o que é dito e o que é feito. Até agora o Presidente Jair Bolsonaro vinha dizendo para os brasileiros que fechando os olhos o problema não existia... Porém, com o agravamento da situação na última semana, o Governo Bolsonaro acabou atropelado pelos fatos. Isto significa que ser governado pelo Bolsonarismo representa um risco adicional para a população. Mais precisamente, significa que no Brasil as pessoas são obrigadas a se protegerem do COVID-19 e do governo. Por isto, como sempre acontece no Brasil, a melhor alternativa é mesmo a autoproteção.

 
 
 
  • 22 de mar. de 2020
  • 4 min de leitura

Atualizado: 3 de abr. de 2020

Por Dr. M. Mattedi.


A luta contra o Coronavírus (COVID-19) vai mobilizando toda a população mundial. Aos poucos as pessoas em todo o mundo vão se dando conta dos riscos sanitários, econômicos e políticos da pandemia. É que o efeito cumulativo da pandemia vai, progressivamente, estabelecendo um clima de muita insegurança e incerteza. Assim, o medo de contaminação vai se misturando com o medo de recessão gerando muita instabilidade política. Por isto, a medida que a mobilização de esforços crescem os conflitos aumentam. Consequentemente, a gestão da emergência do COVID-19 vai se convertendo num experimento social de escala global.


A disseminação do COVID-19 é difícil de ser contida devido a cinco fatores que se encontram relacionados: 1) a inexistência ainda de uma forma eficaz de tratamento; 2) o alto grau de letalidade, principalmente no grupo de pessoas idosas; 3) o caráter assintomático do contágio, o que aumenta o risco de contaminação; 4) a sobrecarga do sistema de atendimento devido a concomitância de pessoas; 5) a cadeia de desinformação gerada pelas mídias sociais. O efeito combinado deste processo é paradoxal, afinal faz com que as medidas de precaução sejam cada vez mais necessárias, porém sempre menos suficientes.


Por isto, o principal desafio constitui determinar qual estratégia de gestão adotar. Considerando as experiências conhecidas até o presente é possível diferenciar duas estratégias predominantes de confrontação do COVID-19: a) Foco na Supressão: manter o número de casos sempre baixos; b) Foco na Mitigação: diminuir o ritmo de avanço da pandemia. Enquanto a primeira envolve um tempo relativamente longo para o desenvolvimento de vacinas, a segunda implica aprender a convive com o problema para evitar que ele volte. Neste sentido, a opção principal constitui a temporalidade: ganhar tempo para entender e controlar o impacto.


Apesar das duas estratégias não serem mutuamente excludentes, até agora tem predominado a estratégia do Foco na Mitigação. Mais precisamente, o protocolo de gestão fixado pela OMS é retardar ao máximo a onda de propagação do vírus. Trata-se, assim, de achatar a curva de contaminação para evitar a capacidade de suporte do sistema de atendimento de saúde. Por isto, em todos os lugares do mundo este processo risco envolve, principalmente, conscientizar a população a seguir as recomendações dos serviços de saúde e governamentais. Porém, a questão principal aqui é como manter a curva achatada por muito tempo.


É que embora os efeitos emergentes provocados pelo COVID-19 sejam alarmantes não existe ainda consenso entre os especialistas sobre a melhor estratégia de gestão. Existem duas de gestão bem-sucedidas de contenção da disseminação do coronavírus: a) Modelo Restritivo: baseado na experiência chinesa de estabelecimento de um controle territorial (Vazio Sanitário); b) Modelo Permissivo: baseado na experiência coreana de realização de intensiva deste de testes (Monitoramento Individual). Verifica-se, desta forma, que as estratégias de gestão do COVID-19 não são apenas uma questão de ordem técnica, mas, sobretudo, de ordem política.


O processo de escolha da estratégia de gestão do risco pressupõe também determinar que estratégia de comunicação adotar. Dito, de outra forma, numa época de sobrecarga de informação, o desafio é comunicar o risco sem agravar o problema de gestão. Neste sentido, o curso se move entre duas posições predominantes: a) Alarmista: deixa a circulação da informação livre; b) Paternalista: filtrar a informação para a sociedade. Consequentemente, a comunicação do risco constitui uma questão

muito delicada na gestão do COVID-19, afinal se enfatizar o excesso de precaução pode promover o pânico, porém enfatizar menos precaução pode potencializar o impacto.


Isto significa que a gestão do COVID-19 desencadeia impactos ambivalentes sobre população: a) Impactos Diretos: efeitos provocados pelo COVID-19 de curto prazo; b) Impactos Indiretos: efeitos provocados pelo COVID-19 de longo prazo. Ou seja, a eficácia da estratégia de gestão depende muito dos modelos que são aplicados para análise. Mais precisamente, trata-se de como é calibrada a relação entre Problema-Solução: a adequação da resposta ao COVID-19 depende de como foi concebido o problema. Portanto, indica que as respostas podem causar ondas de choque econômicas e sociais ainda mais graves: o remédio pode ser pior que a doença.


Ou seja, a gestão do risco se estabelece na tensão entre Liberdade e Segurança. Neste sentido, é possível diferenciar duas posições principais: a) Posição Minimalista (isolamento dos infectados); b) Posição Maximalista (confinamento comunitário). No primeiro caso valoriza-se a liberdade comprometendo a segurança; no segundo caso, prioriza-se a segurança reduzindo a liberdade. Porém, a relação entre estas duas posições não é discreta, mas contínua, afinal inicia-se com a Posição Minimalista e progressivamente transita-se para a Posição maximalista. Portanto, a gestão do risco indica que a medida que o medo aumenta trocamos Liberdade por Segurança.


Acima de tudo a comoção gerada pelo coronavírus esconde um processo político muito bem documentado. Afinal, não existe nada de extraordinário na atual situação de emergência. A pandemia do coronavírus obedece ao Princípio de Continuidade que caracteriza todos os desastres. O Princípio de Continuidade estabelece que existe uma relação de transição entre o Tempo-1 (T1 = condições sociais Pré-impacto) e o Tempo-2 (T2 = as condições sociais Trans e Pós-impacto). Ou seja, quanto mais vulnerável (falta de preparação) no T1, maiores os impactos no T2. Portanto, a calamidade social verificada atualmente constitui um efeito emergente da falta de preparação.


A pandemia do COVID-19 traz embutida implicações de ordem econômicas, políticas e sociais muito complexas. Por isto, as implicações da forma como o COVID-19 se dissemina e a maneira como as estratégias de gestão são implementadas desencadeiam muitas dúvidas e assustam cada vez mais. Estas inquietações dizem respeito não somente ao entendimento do fenômeno, mas, sobretudo, as consequências das formas de confrontação. A intensificação de disputas indica que o pior ainda está por vir. Portanto, a luta contra o COVID-19 é também a luta pela manutenção e ampliação das formas de controle. Afinal, quem controla o COVID-19, controla a sociedade!

 
 
 
  • 18 de mar. de 2020
  • 2 min de leitura

Leandro Ludwig

Arquiteto e Urbanista

Membro do Núcleo de Estudos da Tecnociência - NET


Como em um desastre que possui um gatilho natural (enchente e deslizamento), a gestão de um desastre biológico não pode ter em sua base somente a retirada das pessoas das áreas de risco. Em qualquer desastre, a base de sua gestão é a mitigação (diminuir o risco existente) e a prevenção (evitar o surgimento de novos riscos). O que isso significa? Que somente retirar as pessoas de encostas e/ou áreas alagáveis não garante que a encosta e/ou a várzea deixe de apresentar risco e, principalmente, não evita que outras pessoas ocupem novamente essas áreas.


Ao trazer essa lógica para as medidas mais adotadas frente ao Covid-19, fica evidente que a reclusão/quarentena de uma cidade inteira não deveria ser a base no gerenciamento da crise do vírus (apesar de ser uma resposta eficaz). Após a quarentena (e após todas as perdas sociais, ambientais e econômicas inerentes à paralisação das cidades), a reclusão social não irá evitar que uma única pessoa contaminada faça com que toda a cidade volte a ficar contaminada. É fundamental ter em mente que as vacinas para o Covid-19 estão previstas somente para 2021. Por isso é preciso saber conviver com o risco. Quanto menor a capacidade da sociedade de conviver coletivamente sem propagar doenças, maior a necessidade de intervenções na sua rotina.


Nesse cenário, a solução simples, rápida e que parece mais eficaz, na verdade é apenas uma resposta pautada na ideia de vazio sanitário. Por si só essa resposta não evita que a cidade volte a ser contaminada pelo Covid-19. É uma resposta emergencial e desesperada frente a crise global. Definitivamente não deve ser entendida como a solução desta crise e de outras que possam surgir.


Estamos diante de uma situação urbanisticamente nova. As cidades construídas pelas lógicas do mercado, que até então funcionavam, não possibilitam a manutenção da saúde pública. Nossas cidades são insalubres. Em determinados pontos muita umidade, em outros muito calor. Muita poeira e fumaça. Há problema de saneamento em pequenas, médias e grandes cidades. A arborização urbana é considerada um problema. Habitações e ambientes de trabalho são construídos pautados no ar condicionado, sem ventilação natural. Essa cidade, que até então funcionava e era conveniente, nos mostra agora sua fragilidade e debilidade.


Para vencer o Covid-19 (e outros vírus novos que possam surgir), é preciso incorporar os preceitos da gestão de risco de desastres que possuem gatilho natural. A reclusão deve ser entendida como uma resposta indiscutivelmente necessária e emergencial, mas tendo a certeza de que não é a solução dessa e de futuras crises. A vacina desse vírus, solução definitiva para o Covid-19, não evitará que novos vírus se propaguem rapidamente no futuro. Desastres podem ser encarados como oportunidades de mudança. Devemos aproveitar essa oportunidade para melhorar nossa sociedade, a partir de uma reflexão sobre o desenvolvimento e comportamento urbano. Tornar os ambientes coletivos salubres e resilientes e, capacitar urgentemente a sociedade, são caminhos para que possamos conviver com o risco.

 
 
 
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