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  • 25 de abr. de 2020
  • 4 min de leitura

Dr. M. MATTEDI

Universidade Regional de Blumenau


Anda circulando pelas Mídias Sociais um filme de pessoas entrando no Shopping Neumarkt (Blumenau) e sendo recebidas com música e palmas. Excetuando-se o caráter deliberadamente artificial da cena, o filme evoca mais um passeio num hospital que num shopping. Mas, sobretudo, o filme retrata magnificamente bem o dilema atual: de um lado, setores empresarias forçando o fim do Distanciamento Social; de outro, pessoas temerárias como revelam os dados produzidos pela pesquisa FOCUS-FURB. O fato é que embora o Wishful Thinking de alguns setores sociais não queria, a COVID-19 mudou para sempre nossa relação com o espaço público.


Wishful Thinking é uma expressão inglesa que exprime a vontade de acreditar. Mais precisamente, trata-se de uma visão desiderativa. É que, muitas vezes, rever nossas crenças, principalmente quando muito arraigadas, produz enormes aborrecimentos. Então as pessoas optam por negar os fatos ou, quando isso não é possível, ajustar as evidências em conformidade com as crenças. Por isto, em cenas como a do shopping as pessoas tendem a acreditar que veem o mundo como ele é, quando, na verdade, o mundo é justamente o inverso. Isto acontece porque as pessoas, frequentemente, têm pontos cegos sobre suas próprias motivações e preconceitos.


É que nós sempre preferimos ouvir as coisas que confirmam nossa opinião existente. Isto não é muito estranho, afinal das contas nós costumamos apreciar nossas próprias visões de mundo. Além disso, frequentemente, nós damos muita credibilidade às informações limitadas que temos disponíveis sobre os acontecimentos. E tendemos sempre a avaliar as informações ambíguas de uma forma benéfica a nossas próprias crenças. Isto acontece porque é sempre mais fácil arrumar uma justificativa, que mudar quando a conduta não é compatível com os acontecimentos. É por isto que uma vez que escolhemos um lado num debate, iremos protegê-lo a todo custo.


Embora os estudos sobre Wishful Thinking estejam apenas começando, alguns mecanismos cognitivos que operam nestas situações já foram identificados. Os pensamentos desiderativos podem ser atribuídos a três fenômenos: a) Viés de atenção: as pessoas percebem seletivamente os sinais que vão em direção aos seus desejos; b) Viés de interpretação: a importância de cada sinal é considerada segundo o desejo; c) Viés de resposta: responder mais eficazmente quando os sinais estão em conformidade com os desejos. Isto significa que o desejo é um dos fatores que mais influenciam nossas estimativas e expectativas sobre os acontecimentos na COVID-19.


Neste sentido, a polarização em torno do Distanciamento Social é um bom exemplo de como o Wishful Thinking opera cognitivamente. Se eu desejo que o que o Presidente Jair Bolsonaro diz a respeito da cloroquina seja verdadeiro; então o que o Presidente Jair Bolsonaro disse sobre a Cloroquina acaba sendo verdadeiro para mim. Ao contrário, se eu desejo que o que o Presidente Bolsonaro diz a respeito do Distanciamento Social seja mentira, então o que o Presidente Bolsonaro fala a respeito do Distanciamento Social é falso. Afinal, quando as pessoas querem acreditar que as notícias são reais, isto as faz acreditar que as notícias sejam reais.


Porém, Wishful Thinking numa pandemia é uma receita perfeita de calamidade. Afinal, ao desejar que a atividade econômica seja ativada, o Presidente Jair Bolsonaro falha em proteger os cidadãos que governa. É que o presidente acredita mais nos estereótipos sobre os fatos do que nos próprios fatos. Embora haja evidências esmagadoras dos efeitos positivos do Distanciamento Social, ele prefere negá-las. Por isto ele dissemina uma falsa imagem de segurança que vai acabar amplificando o contágio e prejudicando ainda mais a economia. Neste sentido, o Ciclo de Retroalimentação Positiva da Gestão da COVID-19 ilustra muito bem esta situação.


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Este processo está relacionado a nossa tendência manter uma coerência entre o que dizemos e o que fazemos. Por isto, nós procuramos desesperadamente evitar todo tipo de Dissonância Cognitiva. A Dissonância Cognitiva diz respeito ao desacoplamento entre fatos e crenças. Entre o que acontece no mundo e o que eu penso do mundo. Indica a tensão que uma pessoa sente quando um acontecimento contradiz suas crenças. É por isto que, frequentemente, as pessoas preferem suas mentiras confortáveis ​​às verdades desconfortáveis. Assim, as pessoas para manter a coerência pessoal evitam circunstâncias identificadas como fontes de dissonância.


Portanto, indica que a confiança da população é fundamental para que as medidas de Distanciamento Social surtam efeito. Porém, a proposta do Governo Bolsonaro de acabar com o Distanciamento Social por motivos políticos é incompatível com a segurança da população. Neste sentido, a tensão entre a ameaça de contágio cotidiano e o discurso de normalidade governamental é forte porque está relacionada a vida das pessoas. E isto é normal, pois as pessoas buscam coerência entre suas expectativas e sua vida real. Por isto, não basta querer para a situação se normalizar. As pessoas não voltarão a passear no shopping apenas com Wishful Thinking!


A dissonância entre a música da recepção e a realidade das máscaras indica que vai demorar muito ainda para as pessoas as sentirem tranquilas num shopping center. Embora as pessoas que forçaram o fim do Distanciamento Social não queiram, ir ao shopping na COVID-19 é como passear num hospital. Afinal, ninguém consegue ter uma experiência emocionalmente positiva num ambiente em que todas as pessoas são obrigadas a usarem máscaras para se sentirem seguras; aonde tocar qualquer objeto constitui um risco de contaminação, onde interagir é um risco... Portanto, como demonstra o Wishful Thinking, o autoengano é sempre o prior dos enganos.

 
 
 

Atualizado: 30 de abr. de 2020

"A FURB está vazia, mas a FURB está viva. Isto acontece porque a agitação presencial das salas de aula foi transferida para a distância do mundo virtual. Com isso a mediação pedagógica entre alunos e professores passou a ser estabelecida através de plataformas como Microsoft Teams, grupos de WhatsApp, entre outras. A adesão foi massiva e envolveu a adaptação, surpreendentemente rápida, de alunos, professores e da própria instituição. Porém, os efeitos emergentes (não-intencionados) deste processo são reais e ainda muito pouco conhecidos. Neste sentido, o desafio é acompanhar o processo, reter o aprendizado institucional e adequar aos problemas operacionais."


Considerando estas questões, o Núcleo de Estudos da Tecnociência (NET) realizou uma pesquisa para detectar, ao mesmo tempo, os impactos do Distanciamento Social e a adaptação dos estudantes às aulas on-line. Para isso, foi construído e aplicado um questionário na população estudantil da FURB. Após uma verificação inicial, a equipe trabalhou com uma amostra de 1000 respostas válidas, margem de erro de 2,9%. O modelo de análise empregado indica que os efeitos da Recessão Social sobre o engajamento online tendem a variar segundo a renda, a localização e o período de engajamento: quanto maior a renda e a densidade demográfica, maior o engajamento no distanciamento social. Para conhecer melhor nossa pesquisa, acesse o relatório preliminar disponível AQUI.


Ou acesse um resumo executivo AQUI:




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