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  • 2 de jun. de 2020
  • 10 min de leitura

Josely Cristiane Rosa

jo.cris.rosa@gmail.com

Distanciamento social, restrição de ingresso de visitantes estrangeiros e o fechamento de fronteiras foram medidas que causaram uma parada abrupta em uma das principais características da condição humana: a MOBILIDADE. Presente em todos os períodos históricos, a marcha humana retrata múltiplas eventualidades: de idas e voltas, de idas sem volta e das trocas, que por sua vez dão um novo significado à condição do Ser humano: o sentido do hominibus motus. Tal sentido revelam as aspirações da partida: tão somente um simples movimento ou uma condição de sobrevivência ou até mesmo uma missão heroica! Como àquelas diásporas descritas pelos hebreus, hindus, persas, africanos, indígenas e gregos. Os inúmeros personagens proféticos, messiânicos ou heroicos foram impulsionados pela mobilidade, seja ela real, simbólica ou metafórica. De Abraão, a Moisés, Jesus, Xangó, Buda, a pré-condição de saída da sua terra de origem foi o elemento circunstancial no cumprimento do seu (pré) destino divino e/ou heroico. Nesse cenário, compete o entendimento singular de que o Ser humano não é somente um migrante por opção, mas sim pela própria condição humana!


As mobile lives (ELIOT; URRY, 2010) tem se tornado uma assinatura da contemporaneidade. As diásporas modernas provocaram novos contornos no modus vitae em todas as esferas – social, cultural, política e econômica –, constituindo uma Cultura da Mobilidade (URRY, 2003). Esse contexto pode ser percebido no atual número de migrantes internacionais em todo o mundo. Segundo os últimos dados (Setembro/2019) divulgados pelo Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais da ONU, os migrantes internacionais atingiram cerca de 272 milhões, um aumento de 51 milhões desde 2010. Esse número representa 3,5% da população global. A Europa representa o território de destino do maior número de migrantes internacionais. Aproximadamente, 82 milhões de migrantes internacionais vivem hoje em solo europeu (ONU, 2019).


Compreender a mobilidade é ir além do seu caráter etimológico, do latim mobilitate: propriedade do que é móvel ou do que obedece às leis do movimento. É considerá-la uma expressão da humanidade, uma vez que “combina o movimento (de pessoas, de coisas, de ideias) com os significados e as narrativas que os circundam” (CRESSWELL, 2009, p. 25). De nômades (caçadores-coletores), trovadores, peregrinos, menestréis errantes, representante das cruzadas (sociedade feudal), comerciantes (expansão marítima), à liberdade (ideia de Thomas Hobbes que equacionava movimento com liberdade), considera-se que as alterações na mobilidade humana estão associadas intimamente ao desenvolvimento das sociedades (CRESSWELL, 2006). Nesse contexto, atenta-se para a análise do conceito de mobilidade ser multidimensional, permitindo abarcar uma multiplicidade de fenômenos sociais.


Nesse sentido, a mobilidade passou a ser considerado um fenômeno expressivo da sociedade atual (CRESSWELL, 2006; URRY, 2007; BAUMAN, 2007; ORFEUIL, 2008), ultrapassando as dimensões físicas, corporais e econômicas. Carregando consigo ideias como progresso, liberdade, oportunidade, modernidade (CRESSWELL, 2006), a mobilidade se apresenta como uma das questões que perpassam o cenário presente. Novas mobilidades expressam as possibilidades de movimento e suas implicações sociais, entre as quais está a migração de refugiados e sem teto, as viagens profissionais e de negócios, excursões de estudantes, mobilidade de forças militares, viagens de turismo, etc (URRY, 2007). Essas formas de mobilidade revelam diferentes formas de relacionamento com o lugar. Esse fato permite pensar a dimensão da mobilidade enquanto componente da própria vida social, uma vez que envolve as dimensões cultural, afetiva, imaginária, espacial e individual (URRY, 2007).


Todo migrante, seja ele emigrante, imigrante, refugiado, migrante misto, retirante, indocumentado, legal, clandestino, esperado, expulso, radicado e errante se define pelo motivo que o conduziu ao deslocamento: as transformações ocasionadas pela economia globalizada, às guerras, guerrilhas e o terrorismo internacional ou regionalizado, os movimentos marcados por questões étnico-religiosas, a urbanização acelerada especialmente nos países periféricos, a busca de novas condições de vida nos países centrais, por trabalhadores da África, Ásia e América Latina, questões ligadas ao narcotráfico, à violência e ao crime organizado, os movimentos vinculados às safras agrícolas, aos grandes projetos da construção civil e as mudanças climáticas.


Na perspectiva da multidimensionalidade da mobilitate, como fica a marcha humana (LA BLACHE, 1954) diante da pandemia? Quais as consequências políticas e socioeconômicas causadas pelo coronavírus sobre as famílias emigradas? Tais questões são permeadas por aquilo que já conhecemos sobre a vida de milhares de imigrantes: a vulnerabilidade em ‘ser migrante’. Consideram-se as nuances que se desdobram e que não fazem partem das estatísticas, como por exemplo, os casos de preconceito e discriminação no decorrer da jornada migratória, devido à nacionalidade, etnia, religião, práticas culturais ou gênero. Esses fatores chamam a atenção para as diversas situações de vulnerabilidade que enfrenta a parcela da população migrante, sendo que a todo o momento, o migrante busca um caminho que supere sua condição contraditória. Portanto, evidencia-se que o migrante não vive o movimento migratório de forma polarizada, unidirecional e linear. Suas experiências são relativizadas em função da simultaneidade de práticas culturais, econômicas, espaciais individuais e coletivas que permitem uma inserção ou não do migrante no local de destino.


O migrante é em sua gênese um indivíduo em movimento. Um estrangeiro em terra estranha que projeta ser uma figura enigmática. Um suspeito noticiado nos televisivos e na internet como pessoas distantes, de outras terras, com outras culturas, outras formas de viver. São concepções como essas que esquematizam signos de preconceitos, preconizando uma ruptura de identificação que impede o estabelecimento de uma relação. Passa-se a existência do ‘outro’ e do ‘mesmo’. O ‘outro’ é sempre o estrangeiro, de nacionalidade, de raça, de religião, de etnia ou de língua. O ‘mesmo’ é o concidadão, o irmão de etnia, o congênere, o correligionário. O ‘outro’ também é sempre o inimigo e o que predomina é o ódio e o medo: o ódio que motiva a eliminar o ‘outro’ e o medo de ser eliminado pelo ‘outro’ (MEMEL-FOTE, 2000).


Assim, ao longo do seu percurso, os migrantes são intitulados pela mídia como ilegais, clandestinos, irregulares, refugiados, deportados. Desta forma, “são alvos de uma semantização negativa e "policialesca" que inclui intolerância, violência, desemprego, isolamento, preconceito, pobreza, condenação, fiscalização, deportação, expulsão, tráfico ou detenção” (COGO, 2001, p. 17). Considera-se, portanto, que os meios de comunicação em massa têm papel fundamental no fortalecimento ou mesmo na criação de um imaginário negativo e de aversão em relação aos migrantes (COGO, 2003; BARATA, 2006; POVOA NETO, 2007). Racismo, xenofobia, discriminação, violência e exploração sexual, violações dos direitos humanos, acesso restrito a alimentos e trabalho informal de baixa remuneração são alguns dos dilemas vividos pelos migrantes.


Essas situações nos fazem refletir sobre os vários casos de vulnerabilidade dos imigrantes em tempos de COVID-19. Na Alemanha, onde vivem 1,3 milhão de solicitantes de asilo e migrantes, os serviços públicos destinados a eles estão quase paralisados. Algumas entrevistas foram suspensas e as autoridades também delimitaram as situações para apresentar o pedido de asilo. Só podem ser realizados se o solicitante der negativo ao teste de COVID-19 ou depois de um período de 14 dias de quarentena. Os programas de acolhimento humanitário de refugiados vindos da Turquia e do Líbano também foram interrompidos. Na França, devido às medidas de confinamento e o medo do contágio, o número de voluntários em Calais (norte) diminuiu. Vale destacar que atualmente nessa região se encontram cerca de 2.000 migrantes. Na Grécia, a situação também é alarmante. Milhares de pessoas vivem aglomeradas em acampamentos, sem instalações básicas de higiene[1].


Figura 01: Retorno para casa de afegãos num país com sistema de saúde enfraquecido pelo risco de coronavírus

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Fonte: Nações Unidas Brasil (2020)[2]

Foto: Shahrokh Pazhman/UNOCHA


Outra situação chamou a atenção. Nos EUA, cidades com migrantes brasileiros e hispânicos têm 30% mais mortes por COVID-19. A Falta de acesso à saúde, o medo de deportação, os ramos de atuação profissional e a falta de segurança financeira explicam maior incidência de casos nesse grupo. Outro fator limitador é a situação de vários indocumentados que, por não conseguir regularizar sua situação são impedidos de receber seguro desemprego ou auxílio financeiro do governo americano em meio à crise do coronavírus. No mês de abril, um levantamento sobre a epidemia feito pela BBC News Brasil revelou que o coronavírus não atinge a população americana igualmente, isto é, há mais casos e mais mortes registrados entre as comunidades de migrantes da América Latina. Nos municípios que abrigam mais latinos, os números mostram que os habitantes dessas áreas tiveram entre 20% e 33% mais chances de adoecer e de morrer, em relação aos números do Estado como um todo. A explicação encontrada pelos especialistas é a precária condição de vida e trabalho desses migrantes, que propiciam o contágio e dificultam o acesso ao tratamento[3].


Na Espanha, seis em cada 10 famílias migrantes perderam o emprego durante a pandemia, conforme relata a organização humanitária Save the Children. O levantamento faz parte da campanha #QueNadieQuedeAtrás, na qual a ONG lançou para denunciar a falta de compromisso político com as famílias em situação de pobreza durante a pandemia. A pesquisa evidenciou que mais de dois terços (66%) das famílias de origem migrante estão em situação vulnerável, o que representa o dobro da generalidade das famílias espanholas. Nessa vulnerabilidade está à situação de cortar gastos com a alimentação e atrasar os pagamentos do aluguel das casas onde vivem. Outro dado evidenciado foi o abismo educacional, ou seja, três em cada 10 famílias migrantes não têm acesso à Internet ou não têm boas ligações e quase 36% das crianças usam os telemóveis para estudar, visto que a maioria não tem computador próprio. O resultado disso, é que as crianças em situação de pobreza têm maior risco de reprovar ou abandonar a escola[4].


E como está a questão dos imigrantes na América Latina frente à pandemia? Apesar da existência de diversas organizações e processos de integração regional, como a Organização dos Estados Americanos (OEA), o Mercosul ou a Comunidade Andina, não houve uma resposta conjunta à chegada da COVID-19. Cada país tomou suas próprias providências, de acordo com as orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS). Distanciamento social, restrição de ingresso de visitantes estrangeiros e fechamento de fronteiras foram medidas aderidas ao combate da disseminação do coronavírus. A crise (política e socioeconômica) gerada pela COVID-19 afetou a vida e os direitos dos latinos americanos que vivem fora da região. A paralisação das atividades entendidas como não essenciais impactou a vida de milhares de imigrantes que tem nas atividades informais o seu meio de sobrevivência. Diante de uma situação de precariedade total, as pessoas em mobilidade são expostas à pobreza e à marginalização social. Exemplo desse fato são os milhares de venezuelanos que estão vivendo nas ruas da Colômbia e do Peru, por não conseguirem pagar suas acomodações[5].

Figura 02: Migrantes venezuelanos pedem carona para voltar para a casa, em Chia/Colômbia.

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Fonte: Folha de São Paulo (2020)

Foto: Luisa Gonzalez (02/04/2020).


Algumas notícias rompem o caos atual. É o exemplo da construção de um hospital móvel (Figura 03) na divisa entre os Estados Unidos e o México. A organização internacional Global Response Management (GRM) decidiu pela instalação do hospital para atender migrantes com sintomas de coronavírus na cidade, onde se estima que entre 1.500 e 2.000 pessoas estão aguardando atendimento das autoridades de imigração dos Estados Unidos. Até o presente momento foram realizados cerca de 100 testes para coronavírus e todos foram negativos. Entretanto, o risco é alto devido às circunstâncias que cercam o campo[6]. Outra notícia é que a União Europeia (UE) anunciou nesta terça-feira (26/05) que contribuirá com 144,2 milhões de euros (cerca de R$ 848 milhões) à conferência internacional de arrecadação de recursos para migrantes e refugiados venezuelanos, enquanto o Banco Europeu de Investimento oferecerá 400 milhões de euros (R$ 2,3 bilhões) em empréstimos[7].


Figura 03: Hospital Móvel

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Fonte: R7 (2020)

Foto: Abraham Pineda/Reuters (8/5/2020)


No Brasil presenciamos a criação de redes de solidariedade, como é o caso de uma rede de ação criada por um imigrante haitiano, visando atender mais de 400 famílias haitianas que vivem no extremo leste da capital paulista. Ações assim estão sendo realizadas por imigrantes haitianos e africanos de diversas origens por toda a capital paulista. Além de se organizarem para prestar ajuda às suas comunidades e para cobrar ações do poder público, os imigrantes enfrentam problemas adicionais, como a falta de informações disponíveis em seus idiomas de origem dificultando a prevenção[8].


Que a COVID-19 agravou a situação de milhares de imigrantes em todas as partes, isso é fato! Entretanto, cabe aqui ressaltar que é somente mais um desafio, diante de tantos outros que condicionam o deslocamento humano. A COVID-19 não pode ser somente mais um ‘item’ de discussão nas questões migratórias. Os problemas são mais profundos, ou seja, o processo migratório contemporâneo não se reduz a um mero fluxo de pessoas e/ou trabalhadores, mas integra um importante intercâmbio de bens materiais e simbólicos, isto é, de recursos econômicos, culturais, sociais e políticos entre os territórios de origem e de acolhimento. Assim, aspira-se um deslocamento do olhar da migração para os sujeitos dessa ação: os migrantes enquanto sujeitos que, embora condicionados por circunstâncias estruturais, econômicas, sociais, políticas, culturais e ambientais, também atuam sobre essas condições (re)significando-as. O migrante tem face! E parafraseando Bourdieu, na ocasião do prefácio do livro de Sayad (1998, p. 11) lança-se um olhar para a ‘face’ do migrante:


Como Sócrates, o imigrante é o átopos, sem lugar, deslocado, inclassificável [...]. Nem cidadão nem estrangeiro, nem totalmente do lado do Mesmo, nem totalmente do lado do Outro, o “imigrante” situa-se nesse lugar “bastardo” de que Platão também fala, a fronteira entre o ser e o não-ser social. Deslocado, no sentido de incongruente e de importuno, ele suscita o embaraço; e a dificuldade que se experimenta em pensá-lo – até na ciência, que muitas vezes adota, sem sabê-lo, os pressupostos ou as omissões da visão oficial – apenas reproduz o embaraço que sua inexistência incômoda cria. Incômodo em todo lugar e que doravante tanto em sua sociedade de origem quanto em sua sociedade receptora [...].


Sendo átopos, um sem lugar, deslocado, inclassificável ou ainda nem cidadão, nem estrangeiro, acima de tudo o migrante é um acontecimento social. Nesse sentido, é necessário pensar no fenômeno migratório como um fato social total, e assim, compartilhado pela sociedade de origem e pela sociedade de destino. Origem e destino lembram território, que por sua vez remete a Terra. E Terra é um todo, com partes coordenadas onde “cada área age imediatamente sobre sua vizinha e é influenciada por ela” (VIDAL DE LA BLACHE, 2012, p. 48). A Terra é, portanto, o objeto, e como tal, os homens são coadjuvantes nos seus processos.


REFERÊNCIAS

BARATA, Francesc. Inmigración y criminalización en los medios de comunicación. In.: Flujos migratorios y su (des)control: puntos de vista pluridisciplinarios, 2006.


BAUMAN, Zigmunt. Tempos líquidos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2007.


COGO Denise. Mídia, imigração e interculturalidade: mapeando as estratégias de midiatização dos processos migratórios e das falas imigrantes no contexto brasileiro. Comun. Inf., v. 4, n. 1/2, p.11-32, jan/dez. 2001.


COGO, Denise. Mídia, interculturalidade e cidadania: Sobre políticas midiáticas e visibilidade das migrações internacionais no cenário brasileiro. Trabalho apresentado no Núcleo de Comunicação para a Cidadania, XXVI Congresso Anual em Ciência da Comunicação, Belo Horizonte/MG, 02 a 06 de setembro de 2003.


CRESSWELL, T. On the move: mobility in the modern western world. New York: Routledge, 2006.


CRESSWELL, T. Seis temas na produção das mobilidades. In CARMO, R.; SIMÕES, J. A produção das mobilidades: redes, espacialidades e trajetos. Lisboa: Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, p. 25-40, 2009.


CRESSWELL, Tim. Mobilities i: Catching up. In.: Progress in Human Geography. v. 35, n. 4, p. 550-558, 2011.


ELLIOTT, Anthony; URRY, John. Mobile Lives: self, excess and nature. Abingdon: Routlegde, 2010.


LA BLACHE, Paul Vidal de. O Princípio da Geografia Geral. In: HAESBAERT, Rogério; PEREIRA, Sérgio Nunes; RIBEIRO, Guilherme. Vidal, Vidais: Textos de Geografia Humana, Regional e Política. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2012.


LA BLACHE, Paul Vidal de. Principios de Geografia Humana. Lisboa: Cosmo, 1954.


MEMEL-FOTE, Harris. O outro e o mesmo. In: A Intolerância. Barret-Ducrocq, F. (org). Rio de Janeiro. Bertrand Brasil, 2000.


ORFEUL, J. Une approche laïque de la moibilité. Paris: Descartes & Cie, 2008.


POVOA NETO, H. Imigração na Europa: Desafios na Itália e nos Países da área mediterrânea. In.: Migrações Internacionais: Desafios para o Século XXI – São Paulo: Memorial do Imigrante, 2007.


SAYAD, Abdelmalek. A imigração ou os paradoxos da alteridade. São Paulo: EdUSP, 1998.


URRY, John. Mobile Cultures. Lancaster: Department of Sociology of Lancaster University, 2003. Disponível em: <http://www.lancaster.ac.uk/fass/resources/sociology-online-papers/papers/urry-mobile-cultures.pdf> . Acesso em: 22 nov. 2017.


URRY, John. Mobilities. London: Polity, 2007.

[2]https://nacoesunidas.org/oim-defende-tratamento-digno-a-migrantes-durante-pandemia-do-novo-coronavirus/ [3]https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/bbc/2020/04/19/nos-eua-cidades-com-migrantes-brasileiros-e-hispanicos-tem-30-mais-mortes-por-covid-19.htm [4]https://expresso.pt/coronavirus/2020-05-26-Espanha.-Seis-em-cada-10-familias-migrantes-perderam-o-emprego-durante-a-pandemia-alerta-ONG [5]https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2020/04/migracoes-na-america-latina-em-tempo-de-coronavirus.shtml [6]https://noticias.r7.com/internacional/hospital-entre-mexico-e-eua-protege-imigrantes-do-coronavirus-12052020 [7]https://paginadoestado.com.br/ue-vai-doar-mais-de-r-800-milhoes-para-ajudar-migrantes-venezuelanos/ [8]https://www.brasildedireitos.org.br/noticias/594-imigrantes-africanos-e-haitianos-criam-iniciativas-para-enfrentar-a-covid-19

 
 
 
  • 1 de jun. de 2020
  • 5 min de leitura

Prof. Dr. Maiko Rafael Spiess

mspiess@furb.br

A continuidade da pandemia de COVID-19 e das medidas de distanciamento para a proteção da população impõem enormes desafios. Do ponto de vista das instituições, implicam em alterações nas práticas e procedimentos. Para os indivíduos, significam adaptações mais ou menos forçadas na rotina, nas formas de interação e na gestão do tempo. Nesse contexto, um dos maiores desafios é a adequação das práticas de ensino-aprendizagem. No ensino fundamental e médio (e principalmente na rede pública), esta adaptação tem sido caracterizada, por exemplo, por desafios relacionados ao acesso aos conteúdos e à condução das atividades.

No contexto do ensino superior as soluções também são variadas. Em algumas instituições, houve a opção pela suspensão completa das atividades. Em outras, como no caso da FURB, optou-se por atividades remotas, mediadas tecnologicamente. Este momento único da FURB já foi analisado anteriormente, seja do ponto de vista das condições materiais e práticas dos estudantes para as atividades ou dos impactos de sua continuidade no médio e longo prazo. Essas reflexões foram baseadas na análise de resultados de pesquisa quantitativa, conduzida pelo NET – Núcleo de Estudos da Tecnociência, entre 13 e 18/04.


Uma nova rodada de pesquisa, realizada com os estudantes da FURB entre 04 e 11/05, permite aprofundar a discussão e continuar verificando essas hipóteses. Sobretudo, esses dados e o debate sobre eles permitem à Universidade compreender melhor os desdobramentos da pandemia, considerando especialmente seus impactos futuros nos processos pedagógicos e suas implicações formais e administrativas. Ou seja, permitem um processo de reflexividade: conhecer melhor os posicionamentos e necessidades dos estudantes para conduzir o processo de forma mais informada e dialógica.


Gráfico Interativo 1


Em um primeiro momento, é preciso analisar a evolução da adaptação às aulas remotas (Gráfico Interativo 1). Comparando os resultados da primeira e da segunda rodadas, é possível observar que os percentuais de estudantes com baixo nível de adaptação (de 1 até 4 na escala) permanecem estáveis. Nos níveis de adaptação intermediários (de 5 até 7), é possível perceber uma pequena queda em percentuais. No entanto, nos maiores níveis de adaptação (9 e 10) se percebe um aumento da adequação. Quando considerada a média das respostas, a variação positiva é de apenas 0,13%.


Esses dados permitem algumas interpretações. Em primeiro lugar, em um sentido positivo, é possível supor que exista um perfil de estudantes que reagiu positivamente ao processo de aprendizado institucional e à estabilização das práticas das aulas remotas. Em segundo lugar, parece existir um perfil de estudantes que não estava adaptado e que também não alterou sua percepção neste quesito. Terceiro, é possível conceber um perfil onde a adaptação caiu, possivelmente associada ao fim do “efeito novidade”, ao aumento da intensidade das interações online e, com isso, a uma sobrecarga informacional e um processo de Fadiga Digital.

Gráfico Interativo 2

Os resultados sobre o sentimento de falta das aulas presenciais (Gráfico Interativo 2) parecem confirmar essas interpretações. Neste aspecto, foi solicitado que os estudantes indicassem suas opiniões em uma escala de 1 (Não sinto nenhuma falta) até 10 (Sinto muita falta). Em linhas gerais, se observa uma regularidade em relação às respostas obtidas na primeira rodada, com oscilações dentro das margens de erro. A única exceção marcante é no nível máximo, onde se observou um aumento de 10,24% no perfil dos que sentem muita falta das aulas presenciais. Em termos médios gerais, o sentimento de falta das aulas presenciais cresceu 0,40%.

Gráfico Interativo 3


Na segunda rodada de pesquisa os estudantes responderam também sobre suas condições práticas para as aulas (conexão de Internet, ambiente e equipamentos adequados etc.) e sua satisfação geral com as atividades (qualidade das aulas e conteúdo). Os resultados gerais podem ser consultados no Gráfico Interativo 3 (acima). Em ambas as dimensões, é possível observar que mais de 60% dos respondentes afirmam possuir condições e índices de satisfação entre 8 e 10. Em linhas gerais, isso permite afirmar que os estudantes da FURB possuem boas condições práticas (média de 7,21) e que avaliam positivamente as aulas em regime remoto (média de 6,85).

No entanto, é necessário fazer algumas análises mais detalhadas. Afinal, nem todos os estudantes pensam e agem de maneira igual. Existem variações importantes quando consideramos a realidade dos diferentes Centros e Unidades e, ainda mais especificamente, as condições reais de cada curso. O Gráfico Interativo 4 (abaixo) permite perceber algumas especificidades e regularidades a respeito das duas dimensões aqui abordadas. Neste ponto, por exemplo, é importante ressaltar que os resultados para cursos com baixos números de respostas podem não corresponder ao quadro real da opinião de todos os estudantes.

Gráfico Interativo 4

(utilize a legenda para exibir ou ocultar os Centros e unidades)

No caso de cursos com maior número de respostas (como Direito, com 62 respostas) é possível assumir que as respostas sejam mais próximas das condições reais do conjunto dos alunos. De toda forma, o desafio institucional colocado para o momento atual é manter ou melhorar as condições observadas. Além disso, é necessário considerar as dificuldades relacionadas ao aumento do tempo decorrido desde o início do Distanciamento Social, à necessidade do cumprimento da carga-horária de atividades práticas em alguns componentes curriculares e à adesão ao calendário acadêmico. Todas estas questões implicam esforço e ajustes coletivos.


É claro que esses ajustes e dificuldades trazem questionamentos sobre a continuidade das aulas em regime remoto. Nesse sentido, por um lado, a solução do retorno das aulas presenciais em condições normais ainda está vedada legalmente; além disso, poderia ser prejudicada pelo medo generalizado do contágio. Por outro lado, em uma posição mais drástica, existiria a solução do cancelamento total do semestre – posição defendida por 19,34% dos estudantes na última pesquisa (Gráfico Interativo 5, abaixo). No entanto, a manutenção das aulas online, apesar de todas suas limitações, continua sendo apoiada por 70,3% dos respondentes.

Gráfico Interativo 5


Tudo indica que o pico da pandemia ainda não foi atingido. Por isso, a posição dos alunos é fundamental para sinalizar aos professores e à gestão superior quais os próximos passos a serem tomados. O ponto central é, portanto, combinar a segurança da comunidade universitária com a melhor qualidade e aproveitamento possíveis para as aulas teóricas. Apesar de algumas dificuldades e problemas pontuais, os dados das pesquisas indicam que o processo de adaptação da FURB foi suficientemente bem sucedido para garantir a continuidade desta solução excepcional até quando for seguro para todos.

Por fim, vale lembrar que a natureza do financiamento privado da FURB (mensalidades dos alunos) torna mais complexas as decisões sobre as atividades durante a pandemia e o retorno das atividades presenciais. Resumidamente, o dilema é: não é possível suspender completamente as aulas, mas também é não responsável retomá-las sem cuidados. No entanto, os dados indicam que a FURB tem boas condições para atravessar esta crise. Para isso, é muito importante que continuemos atentos aos efeitos das aulas remotas em nossa comunidade, realizando os ajustes necessários para resistir aos efeitos de média duração do isolamento e da digitalização da vida cotidiana.

 
 
 
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