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O MERGULHO NA INSENSATEZ

Atualizado: 3 de abr. de 2020

Dr M. MATTEDI Universidade Regional de Blumenau mam@furb.br


O pronunciamento do Presidente Jair Bolsonaro no dia 24/03 foi um deboche moralmente inaceitável. Ao reduzir as perdas de vida e a calamidade pública uma “gripezinha” ou uma “resfriadozinho” revela uma absoluta falta de solidariedade com o sofrimento do povo. Se não bastasse isso, aumenta a sensação de insegurança e dificulta ainda mais o processo de gestão. Afinal, uma coisa é questionar estratégias de gestão, outra bem diferente é negar o risco. Fica claro, assim, que para o presidente a única coisa que importa mesmo é a manutenção do poder. Por isto, a primeira reação foi de abalo, indignação e fúria diante deste pronunciamento nefando.

Ao pronunciamento do presidente se junta também a chantagem desumana dos empresários com os trabalhadores. É que se as atividades econômicas permanecerem paralisadas os trabalhadores serão demitidos. Por isto, o recado foi voltem logo ao trabalho ou serão demitidos. Dito de outra forma, os trabalhadores deveriam se preocupar mais com o salário que com a saúde. E a mensagem foi clara: trocar o medo da contaminação pelo medo da perda do emprego. Do ponto de vista empresarial, portanto, é mais importante salvar os negócios que salvar vidas. A brutalidade e oportunismo dessa chantagem só não é mais revoltante que a sua crueldade.

Porém não devemos nos deixar levar por estes sentimentos. Afinal, trata-se de uma armadilha política. Estes ataques não são apenas provocações insanas. Trata-se de uma jogada ousada diante do progressivo isolamento político do presidente. Estas manifestações devem ser interpretadas como uma reação calculada frente a perda legitimidade política. Por isto, não devemos nos enganar: quanto menor o apoio político, maior a radicalização política. O plano autoritário do Bolsonarismo é enfraquecer as instituições democráticas. Pois seu único objetivo foi, evidentemente, intensificar divisão do país e forçar uma ruptura institucional.

Para enfrentar a pandemia e a recessão que virá o Presidente Jair Bolsonaro terá que governar. Precisa conceber e implementar um plano de emergência para os próximos meses. Milhares de brasileiros correm risco de morrer ou perder o emprego. Porém, o Governo Bolsonaro encontra-se paralisado. O presidente não consegue mobilizar e liderar o processo político necessário. Isto acontece porque o Bolsonarismo não sabe governar dentro do perímetro institucional democrático. Portanto, constitui uma ameaça a democracia. A questão é determinar como o Bolsonarismo deve ser bloqueado politicamente. Existem duas estratégias predominantes.

A primeira constitui a Via Curta. Parte do pressuposto que o Presidente Jair Bolsonaro precisa ser barrado politicamente. Esta estratégia compreende a interrupção do mandato por meio do afastamento legal do presidente. A crise sanitária do coronavírus coloca cada vez mais em dúvida a capacidade do Presidente Jair Bolsonaro permanece a frente do cargo. Neste sentido, seria acusado de improbidade administrativa diante da calamidade. Em outras palavras, o presidente constitui uma ameaça política para ser deixada sem controle. Neste sentido, o desgaste político do presidente na gestão da crise permitiria iniciar um processo de impeachment.

A segunda refere-se a Via Longa. Esta estratégia diz respeito ao isolamento político do presidente. Diante de um governo desarticulado e inoperante é necessário formar um consenso político que permita controlar a emergência. Este processo passa pela instituição de uma frente de resistência social forma lideranças políticas e da sociedade civil que sirva de referência para a população. Ou seja, impedir que o presidente represente uma ameaça ao processo de gestão da crise. Trata-se, portanto, de utilizar este consenso para formação de uma frente democrática que bloquei eleitoralmente a propensão autoritária do Bolsonarismo em 2022.

Por isto, o objetivo do pronunciamento do Presidente Jair Bolsonaro foi manter a sociedade brasileira dividida e enquadrar o governo. Por um lado, joga o medo de contágio da classe média, contra o medo da classe baixa de perder o emprego. Por outro, tenta alinhar o governo contra a estratégia dos governadores de confinamento social. Ou seja, presidente apostou na radicalização para tentar atrair politicamente uma parcela da população inquieta com as restrições e alinhar o governo. Porém, o impasse político criado pela convergência das crises sanitária e econômica pode obrigar o presidente a renunciar diante da rápida perda de governabilidade.


Afinal, desde que assumiu a presidência Bolsonaro sempre brigou com a realidade. Porém, o pronunciamento provou que não está à altura do cargo que exerce. Ficou evidente que é incapaz de enfrentar a crise do COVID-19. Isto acontece por interpreta a pandemia como uma tentativa de enfraquecer seu governo. Explicita um movimento de radicalização política absolutamente desnecessário e inconsequente. Afinal, ao levar a estratégia de polarização ao limite põe em risco a saúde de milhões de brasileiros. E, para quem ainda duvidava do Bolsonarismo, ficou evidente que se trata apenas de um projeto de verticalização do poder.


A situação atual é de extrema gravidade. O COVID-19 já matou muitas pessoas e parece que, se depender do Governo Bolsonaro, vai continuar matando. Ao mesmo tempo, está cada vez mais claro para a população que a dinâmica política do Bolsonarismo é destrutiva. Por isto, por um lado, a intenção do pronunciamento do presidente foi dividir ainda mais os brasileiros e, por outro, transferir o ônus do Confinamento Social para os governadores. Portanto, não devemos nos surpreender se Governo Bolsonaro se valer da incapacidade de governar para propor, justificar e impor uma ruptura da ordem democrática através de medidas de exceção.




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